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Resgate de músicas do Mestre e companheiros
Escola Cruzeiro
"Atualmente nas escolas públicas e
universidades do estado do Acre e em qualquer pesquisa acadêmica em todo o
mundo, quando se questiona sobre uma música autenticamente regional acreana o
Santo Daime é citado como um principal exemplo. Na década de 1930 Raimundo
Irineu Serra iniciou sua obra cultural espiritual utilizando a ayahuasca, um
chá enteógeno utilizado milenarmente pelos povos originários da Amazônia
ocidental, na área periférica de Rio Branco.
Neste local atualmente
conhecido como bairro Manoel Julião sua comunidade foi duramente perseguida e
em 1945 conseguiu migrar para um seringal, área de mata nativa horas distante
da cidade onde conseguiram desenvolver seu modo de vida em liberdade. Mestre
Irineu, sempre acompanhado destas famílias, durante décadas recebeu doentes
desenganados que por seu trabalho eram curados e muitos se fixaram na
comunidade.
A prática de criar versos e a criação de melodias era
constante no dia a dia, como recreação e exercício intelectual através de
adivinhas, enigmas e histórias contadas à luz da lamparina antes de dormir. No
uso da ayahuasca a música produziu alguns milhares de canções espirituais
através de muitas gerações que viveram por décadas por pela experiência. Estas
músicas são chamadas de hinários e dão de uso restrito aos trabalhos
espirituais, não sendo permitias para publicações e veiculações com outros
fins.
Além da música sagrada dos rituais, também existiu a composição
artística, que ainda é denominada simplesmente de “música”, fazendo uma
distinção entre sua finalidade restrita de uso espiritual e a de uso social em
festas, homenagens, recreação, educação, aconselhamento e até de forma
pioneira, denunciando temas como o racismo por exemplo.
Segundo seus
contemporâneos, Mestre Irineu Serra compunha no dia a dia, durante os trabalhos
de roçados, e também presenteava seus afilhados com canções. A comunidade
também retribuía compondo músicas em sua homenagem e no geral, desde a infância
até o falecimento, seja recebendo hinários ou compondo músicas, a criação
acontecia muito naturalmente no dia a dia, cumprindo também uma dinâmica de
comunicação social.
No final da década de 1950 foi criada uma escola
para alfabetização de crianças e adultos que funcionava dentro da sede dos
trabalhos de Daime, batizada de Escola Cruzeiro. Foram criadas ou recolhidas e
depois ensinadas para as crianças, músicas coreografadas e canções em língua
indígena e então apresentadas para o mestre e comunidade no dia dos mestres e
outras datas importantes.
Deste universo musical, até o anos de 2018 só
restavam os hinários de uso restrito ao contexto espiritual, até que a senhora
Raimunda Serra começou a rememorar e ensinar as canções de uso social que
estavam esquecidas. Com o incentivo da liderança espiritual e da esposa do
Mestre Irineu, a senhora Peregrina Gomes Serra, diversos contemporâneos
participaram de um projeto para a recuperação e registro fonográfico deste
universo musical.
É um álbum musical comunitário, com a participação de
5 gerações que procurou reconstituir a linguagem da época através de trabalho
de pesquisa junto aos mestres tradicionais, priorizando a execução dos
instrumentos e vozes por estas famílias. Muitos deles aprenderam este
repertorio ainda crianças e é uma sorte muito grande a participação deles neste
registro. São eles: Raimunda Serra, Jane Carioca, José Carlos Carioca, Júlio
Carioca, Leonel Grangeiro, Guilherme Grangeiro, Francisco de Assis (Sr. Preto),
Chayane Carioca, Cris Granjeiro, Luis Lima e Leilane Grangeiro.
Gravado
no ano de 2021, em Rio Branco na comunidade Alto Santo, com recursos da Lei
emergencial Aldir Blanc de socorro à cultura na pandemia.
Está
disponível em todas as plataformas musicais! Aproveitem!
Alexandre Anselmo,
gratidão! Sem
Você esse projeto jamais sairia do papel."
Texto de Chayane Carioca